No fim de ano
tentamos refrear a mente e se concentrar em algumas metas para o próximo ano,
baseadas em nossas experiências passadas, sejam elas boas ou más. Quero dizer,
se as metas e planejamentos deste ano se realizaram conforme gostaríamos.
Não,
felizmente as coisas saíram do controle. E em algum momento nos pegamos puxando
os cabelos ou resmungando os pensamentos irrefreáveis. Ou passamos por um
aperto, perdemos as oportunidades, tudo que construímos foi em vão e assim
sucessivamente os obstáculos nos encurralaram. Considerem-se felizes!
Quando a vida
se resume a manter o que se pode controlar, que não foge ao nosso controle,
exigindo esforço que garantirão a felicidade, estamos nos iludindo, isto não é
felicidade.
Os obstáculos
exigem que a vida se movimente. Esta ação gera resultados, quase sempre
inesperados, e nos obriga a reagir com certa indignação. Naturalmente
gostaríamos de nos acomodar, mas nem sempre – na verdade, nunca –, esta
inanição é sinônimo de felicidade.
Pense bem, os
obstáculos são meios – hábeis – para se conseguir o fortalecimento de ideias e
metas. Pouco sabemos das potencialidades da mente, se soubéssemos do que
seríamos capazes, o sofrimento deixaria de existir. Não é uma condição de
vantagem, mas sim de aplicabilidade. Como não temos razão para acreditar nestas
palavras, seguimos esperando uma intervenção divina e que os problemas se
resolvam ou desapareçam por si só.
Nunca pesou
para que servem estes obstáculos, provas? Quais são os objetivos delas? Se
pararmos para pensar, muito provavelmente estas fazem parte daquilo que
chamamos metas. Pois então, neste próximo ano tenham certeza que por trás de
suas metas e desejos estão oculto os obstáculos que possibilitarão alcançar
seus sonhos. Não fiquemos parados diante do primeiro problema, nem maldizendo
Deus – ou os outros –m, porque esta pode ser a grande oportunidade.
Não dizem que
quando se fecha uma porta, Deus abre uma janela?! Quanto ao sofrimento que
surge destes embates: não passam de ilusões daquilo que supomos certo ou
errado. Daquilo que não queremos abrir mão. Dos nossos medos.
John
Garrigues (1868-1944) foi um dos teosofistas mais influentes do século 20, mas
trabalhou de modo anônimo. Co-fundador da Loja Unida de Teosofistas, LUT, em 1909, ele escreveu vários livros e
centenas de artigos durante mais de três décadas, e cumpriu um papel chave na preservação da literatura
teosófica original. O texto a seguir foi publicado inicialmente na revista
“Theosophy”, de Los Angeles, em sua edição de julho de 1932 (pp. 394-395), sem
indicação sobre nome de autor. Uma análise de seu conteúdo e estilo mostra que
foi escrito por Garrigues. Título original: “Obstacles and Opportunities”.
Transformar fatos aparentemente
negativos em potencialidades para o bem é o primeiro e o último passo no
caminho da Sabedoria.
[John Garrigues]
As
circunstâncias não são nada mais e nada menos do que os meios - e os únicos
meios eficazes - pelos quais o indivíduo pode experimentar conscientemente a
natureza das suas ações, e assim conseguir conhecimento de primeira mão. Os
acontecimentos e as circunstâncias são apenas lições criadas por ele mesmo e
que tornam possível para ele erguer-se, de acordo com a Lei, através dos
diversos níveis daquela grande Escola de autoaprendizado que nós chamamos de
existência humana. Reconhecer
que isso deve ser assim é comparativamente fácil para quem já percebeu que o
ensinamento teosófico sobre a absoluta universalidade da lei faz todo sentido.
Mas compreender de fato que é isso o que ocorre implica muito mais do que uma
compreensão intelectual da Lei. Para
isso é necessária uma completa autoidentificação com o funcionamento da Lei.
Se alguns
acontecimentos e circunstâncias ainda podem ser percebidos por nós como
“ruins”, como “desfavoráveis”, ou como “obstáculos”, nós ainda temos que
aprender o ABC da Vida. Podemos reconhecer mentalmente que a Lei governa o
universo, mas ainda temos que compreender o funcionamento desta lei dentro de
nós mesmos.
Se os
acontecimentos atuais parecem ser obstáculos, se as circunstâncias atuais
parecem desfavoráveis, se o cumprimento dos nossos deveres atuais parece
atrapalhar-nos, então há alguma coisa errada; não com os nossos deveres atuais,
mas com a nossa concepção de dever; não com as circunstâncias atuais, mas com o
modo como usamos as circunstâncias; e não com os acontecimentos atuais, mas com
a nossa atitude diante de todos os acontecimentos.
Nós
costumamos pensar que alguns fatos são favoráveis e outros desfavoráveis? Se pensamos isso, tanto os fatos favoráveis
como os desfavoráveis estão obstaculizando o nosso verdadeiro Poder de
Percepção.
Imaginamos
que as circunstâncias são uma questão de boa ou má sorte? Neste caso, permanecemos como escravos das
circunstâncias, e não compreendemos o nosso Poder Divino de Escolha.
Vemos o Dever
como algo imposto a nós desde fora para dentro? Neste caso, cada dever nosso
funciona como obstáculo, impedindo-nos de despertar a Vontade Espiritual.
Pensamos que
a vida é feita de obstáculos e oportunidades?
Então continuamos lamentando e comemorando, e lamentando de novo, e
outra vez comemorando, ao invés de aprender com ambas as situações,
compreendendo o significado e o propósito da existência humana.
Desde o ponto
de vista da Alma, há um único obstáculo verdadeiro, e ele é a nossa dificuldade
de ver, em tudo o que nos acontece, uma lição a ser aprendida e uma oportunidade de ouro para aumentar a
nossa força e a nossa compreensão. Seria possível adquirir conhecimento, sem
eliminar a ignorância? Seria possível
obter força, sem vencer a fraqueza? Seria possível ter oportunidades, sem
vencer obstáculos? A fraqueza vencida é a força. A ignorância eliminada é o conhecimento. Os
obstáculos superados são as oportunidades.
Aprender, ao invés de ter alternadamente prazer e sofrimento, é
Sabedoria.
A maior
oportunidade ao nosso alcance está no cumprimento consciente dos nossos deveres
atuais, no uso correto das atuais circunstâncias, e na aceitação de bom grado
dos acontecimentos atuais, quer eles pareçam favoráveis ou desfavoráveis.
Quanto maiores as nossas dificuldades, maior a oportunidade para que nos
tornemos mais fortes, mais sábios, e, portanto, mais úteis como membros da
família humana.
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