sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

não somos tão diferentes assim

  
As histórias sempre se repetem.

Certo, algumas parecem mais absurdas ou incoerentes do que outras e portanto somos levados a crer que existam pessoas que compartilham de certas vantagens. É tudo uma questão de tempo e oportunidade para que possamos enfrentar os nossos monstros. E como ouço muito que os enfrentamentos ou atritos ou problemas ou obstáculos ou eteceteras são meios para nos impulsionar, começo a acreditar que isto é verdade. Infelizmente temos a tendência de aceitar bem somente os embates salutares, como uma competição profissional ou mesmo uma prova de vestibular – é claro e evidente que existam muito outros bons combates -, mas negligenciamos aqueles confrontos indigestos que teimam em nos encurralar, porque não enfrentamos. O medo nos impede de enfrentar um inimigo tão poderoso.

Superstições de mentes entalhadas – inclusive a minha – sou o primeiro a levantar o dedo e confessar os meus medos.

Entre os meus maiores inimigos está uma doença incurável, aperfeiçoada pelas constantes observações de médico que como tantos enfatizam as nossas incapacidades. Mas tudo bem, estas seriam as minhas impressões do meu primeiro bom combate com ela:



“Lembro-me que estiquei as pernas e atravessei os braços para me aquecer enquanto o ambiente hospitalar se esvaziava e me perdia nas imagens de uma televisão muda. Não gostava de esperar por algo cujo resultado eu sabia. As lâmpadas fluorescentes falhavam.
Estava escuro quando fui convocado. Bem sabia que a consulta seria mais uma interminável rotina para verificar o meu quadro de saúde – ou de piora.
Para ser sincero, ainda não me sentia enfermo. Entretanto havia recebido um título que poderia mudar a vida de um homem, para sempre. Ainda me lembro do diagnóstico depois de ressonâncias e exames de sangue, para o meu pavor de agulhas. Nestes episódios eu me aproveitava da falsa impressão de que tudo estava bem e me confiava ao medo com o subterfúgio de uma personalidade que eu só usava em casos extremos.
Fechava bem fortes os olhos, dominava a minha admoestação e terminava com expressão de bon-vivant. Pois era esta que ainda me mantinha confortável perante as circunstâncias que eu mais detestava. Médicos, hospitais, doentes e impotência.
Um dia desses, eu percebi um comentário que me abalou. Ninguém quer ficar doente. Nada mais lógico. Contudo, assim que eu soube que estava incuravelmente diagnosticado, experimentei um alívio. Muito alívio. Alívio até demais.
Tanto alívio que o médico, que esperava alguma reação nefasta ou caótica, ficou me encarando absorto. Tenho quase certeza que ele pensou que eu não havia entendido, ou estava em choque, ou mais doente do que cogitava. E daí se me sentia bem?
Um doente é feito de seus exames.
E seus medicamentos, que no meu caso se compunham de vacinas dia sim e não. Se era para ser uma catarse com agulhas, eu teria que aplicá-las sozinho. E com o tempo se tornaria mais um hábito – doloroso.
Porém a doença é no cérebro, e eu desconfio que afeta algumas das áreas mais inconvenientes para mim. Pois eu ainda tremo só de pensar em agulhas, mesmo as finas e pequenas subcutâneas de aplicadores violentos – que eu jamais pensei em usar.
A doença pode ser um carma, um sofrimento sem fim, a doença deprime e corrói os sentimentos, destrói as fundações familiares, sociais e profissionais. A doença redefine atitudes e ações e atrai aqueles que te amam e afastam os falsos. Ou o contrário, afasta aqueles que diziam te amar e atrai o amor de incógnitos.
Conforme suas crenças, a doença pode ser uma prova ou expiação, um castigo, a punição de Deus. Dívidas contraídas de um passado, missão ou a bondade de Deus. Porque todo o mal passa inexoravelmente pelo crivo da bondade de Deus.
Por convenção eu me enquadraria naqueles cuja enfermidade é a prova para aperfeiçoamento de algum débito nascido em vidas antigas o suficiente para não me recordar. Ou seja, fiz e agora tenho que pagar. Por sorte ainda consigo aceitar a resignação e possivelmente consiga me adaptar às dificuldades que venham a surgir.
Menos para as mais óbvias. Porque tenho a incapacidade de perceber os meus erros, assim como a maioria das pessoas que apontam julgamentos de dedos firmes e não percebem que possuem as mesmíssimas qualidades ao qual se apressam em denegrir.
As minhas aptidões neste campo incluem que todos sempre são mais admiráveis do que eu. E acabo passando a impressão errada de que eu estou melhor do que eu mesmo suponho.
Na primeira chance em que eu me confrontasse com o espelho, veria um idiota que não conseguia disfarçar a sua azucrinante arrogância adubada por tolice.
Valendo-se de uma doença como pretexto para uma situação que chegava à sua fronteira. Por isso senti alívio quando algo justificou a minha fraqueza. Eu não era acusado pelas derrotas. Embora também o seja.
Alguém assumia as minhas culpas – uma doença degenerativa incurável – enquanto eu ganhava tempo para respirar aliviado.”


Capítulo 13, Livro de Mateus – eu mesmo.



 

A minha primeira incursão no mundo maravilhoso de Sócrates, Conhece-te a ti mesmo e conhecerás o universo e os deuses. Sou capaz de assumir as minhas fraquezas, por que você não? O que você teme mostrar para o mundo? É capaz de deixar que medo, ansiedade, doença, arrogância, ignorância e tantas outras criaturas místicas criem vida? Comece por se conhecer. Como?!
Ah! 


Nenhum comentário:

Postar um comentário